quinta-feira, 27 de abril de 2017
quarta-feira, 26 de abril de 2017
O ARTIGO TERCEIRO (6)
O PODER
(texto
e postagem márcio josé rodrigues)
Quando
Mãe Natureza Criadora gerou os viventes deu-lhes três dons:
- Uma inteligência para aprender as
coisas necessárias de viver, uma vontade para agir e sobreviver e uma
consciência para dizer o que é certo ou o que é errado.
Ficou estabelecido que todos
podem fazer o que quiserem, desde que
obedeçam à consciência e não façam nada de ruim à natureza (que, é o
conjunto do ar e dos ventos, da água, dos rios e fontes, da terra onde pisamos
e de tudo o que nela vive).
Todo indivíduo que cuida da
natureza é um político.
Botos pescadores no canal da barra - Laguna (foto Elvis Palma) |
Mas, um dia, há muitos séculos
atrás, apareceu uma doença misteriosa que atingiu a consciência de alguns
viventes, "o poder."
Foi assim que nasceu o primeiro Sapolítico, que é um indivíduo doente
de “poder”.
O Poder é uma anomalia ou
disfunção, um acidente nos caminhos da evolução que aconteceu na espécie dos
sapos e vem afetando muitos indivíduos há várias gerações.
O poder se origina num
lugar da personalidade de cada vivente, chamada Consciência Moral, que cada
criança vai adquirindo aos poucos desde cedo e pela vida toda, por meio da educação, como respeito, compaixão,
direito, dever, verdade, justiça e liberdade.
Os grandes Sápios
chamaram a esta consciência moral de Superego.
E quem não tem superego
é conhecido como Psicopata, que é um predador além da necessidade de viver.
Não é fácil distinguir
um psicopata entre os demais da população.
Porque eles são mestres
no disfarce. São muito inteligentes e sabem ser encantadores.
São mentirosos
descarados, convincentes e muito imaginosos.
São fascinados pelo
poder.
São capazes de qualquer
coisa, para ter o poder, Ficar no poder, Conservar o poder.
Esta “qualquer coisa”
inclui mentir, enganar, encantar, fingir, representar (e coisas muito piores,
horrendas).
Eles não sentem
remorso, nunca, não têm a consciência moral para se arrependerem de nada.
Passam por cima de
colegas, caluniam, denunciam, bajulam, sempre para subir mais no poder.
Agora, preste atenção
neste sinal muito claro:
Eles não sentem gratidão.
Jamais terão algum
reconhecimento por algo que você fez por um deles.
Se você já recebeu esta
resposta, “você fez porque quis, eu não lhe pedi”, você pode estar diante de um
psicopata.
Enfim, “O Poder” os seduz e os deixa completamente alucinados. Possui um feitiço que os domina de tal forma, que neles, corpo, mente, coração, existem somente em função de “O Poder”.
Um Sapoderoso é movido
por três forças que podem ser também sua fraqueza: a ambição, a vaidade e o
medo.
Precisam ser ricos para terem “amigos” e serem admirados, balulados.
Para serem ricos
corrompem e são corrompidos.
Mas vivem em estado de
angústia permanente, pois não são amados.
Não podem confiar em
ninguém.
E vão viver assim para
sempre, em sobressalto permanente, em guarda, sem trégua nem descanso, sempre
desconfiando, acordados ou dormindo.
Se você ainda quer o
poder, saiba que não poderá nunca mais sentir nojo, vergonha, compaixão ou
remorso - e paz.
Medo
Medo, o
algoz que atormenta,
Invadindo tua
noite solitária,
Em cada
canto escuro se apresenta
Imagem de
fantasma, imaginária.
Vampiro mau
de asas monstruosas
Que se
debruça e te oprime o peito
Sombras do
mistério, tenebrosas,
Que te
sufocam no teu próprio leito.
Ah! Que
angústia, dor e sofrimento.
Sentir o
coração bater incerto.
Lá dentro,
fria, a garra poderosa,
Cruel,
tenaz, sem afrouxar o aperto.
Um poder que
não se mostra, entanto,
Demônio
pronto a aparecer num instante,
Presença
ruim envolta em negro manto,
Prestes a
troar, num grito horripilante.
sábado, 22 de abril de 2017
O ARTIGO TERCEIRO (5)
REFLEXÕES SOBRE O PODER
márcio josé rodrigues
Um cheiro desagradável de bolor, umidade e restos fecais em decomposição
dominava o espaço da quase escurecida caverna naquela hora mais quente do dia.
Mesmo que a esta hora todos os seus ocupantes devessem estar adormecidos,
Sapolítico não conseguia fechar os olhos descomunais.
Uma angústia incontrolável comprimia-lhe o peito à medida que a ansiedade se
descarregava em tiques nervosos em seus pulos de cá para lá e de lá para cá num vai vem
interminável pelo chão lamacento do recinto. A imensa boca estava seca e o papo
tremia num ritmo descontrolado, embora sem emitir algum som. À medida em que a
boca mais secava, a baba espessa lhe colava a língua ao céu da boca.
Sapolítico sentia medo, muito medo.
Alguns assessores, sapolíticos menores distritais, traziam-lhe notícias dos "currais" daando-lhe conta das
dificuldades em conseguir os preciosos sufrágios necessários para sua
permanência no poder. Os chefetes dos clãs e proprietários da vontade dos
eleitores na disputa eleitoral revelavam seu grande descontentamento com o último governo
que, não cumprira as promessas da campanha eleitoral nem honrara os compromissos
individuais.
Esta, Sapolítico teve que engolir, mesmo com a boca seca.
A cada
chefe de grupo local a quem pediam sufrágios, obtinham exigências de trocas,
barganhas, nomeações para mais cargos e favores, além do câmbio direto em moeda
corrente, sem o menor pudor ou vergonha na cara.
O mais
celebrado cidadão, tido como modelo de caráter, alicerce moral das antigas
tradições, exemplo vivo às futuras gerações, também votaria no candidato, com a
condição de cumprimento de certas exigências em favor pessoal e da família.
O velho Sapolítico,
acostumado a viver deste jogo por décadas, sabia muito bem das causas para que
se chegasse a este ponto.
Seu partido
e seus governos sucessivos haviam destruído a educação, ridicularizado as
crenças, explorado a fraqueza dos necessitados e a ganância dos ricos.
Em Lagoa não
havia mais sufrágios de graça como nos velhos tempos em que se votava num
cidadão e em suas propostas, por direito e vontade cívica livre de cada um.
A busca
desenfreada pelo poder determinara a corrosão das consciências e tornara o precioso e sagrado
sufrágio em reles matéria de barganha.
Na medida em que se digladiavam na
conquista de um eleitor, o preço por um voto tornara-se impraticável e, sem o
respectivo pagamento não havia voto.
“Toma lá, dá
cá”, “é dando que se recebe” e mais a velha e simples lei da oferta e da
procura.
Sino português - do reinado de Dom João I instalado com a criaçao da "Villa da Laguna de Santo Antônio" em 1714. (roubado e não procurado do Museu Anita Garibaldi em 2016) |
Réquiem para
uma cidade
Minha querida
cidade
Onde passei
minha infância,
Onde colhi a
fragrância
Dos dias da
mocidade.
Onde plantei
os meus sonhos,
Onde sonhei
meus amores,
Onde, nas
mãos de impostores,
Chegaram
dias tristonhos.
Venho encontrar-te
em desgraça
Abandonada
na rua,
Miserável, pobre
e nua
Em tua fria
carcaça.
Ao teu
cadáver, a massa
Baixa os
olhos, de vergonha,
Toda esta
gente pidonha,
Indiferente,
que passa.
O que
fizeram contigo?
Quem te
feriu desse jeito?
Quem rasgou
assim teu peito
E te
infringiu tal castigo?
Pobre, mendiga cidade
Das ruas
cheias de lixo,
Do "
cidadão" que é um bicho,
Que te suga sem
piedade.
Seu caráter, tão rameiro,
Que mesmo
não sendo pobre,
Por umas
moedas de cobre
Te vende por
vil dinheiro.
Gente que se
acha astuta
Faz do voto um
rendimento,
Como o
gigolô nojento,
Que vive da
prostituta.
Só te sobrou
esta escória
Para suster
teu presente?
O que quer
toda essa gente
Que te
perdeu a memória?
Ao turvar
este teu brilho,
Ao te cavar
teu jazigo,
Na mesma tumba,
contigo,
Sepulta seu
próprio filho.
Pois, quem
mata sua terra,
O próprio
destino sela:
Também vai morrer com ela
E a mesma
cova o enterra.
quarta-feira, 12 de abril de 2017
O ARTIGO TERCEIRO (4)
A HISTORIA DE RANA
marcio jose rodrigues
Rana era uma linda perereca que
habitava com sua pobre família à beira de um lindo lago.
O lugar, aparentemente pacato e sem
novidades importantes, tinha entardeceres paradisíacos e quando o sol se punha por
trás das montanhas, nas águas lisas como um lençol estendido a perder de vista,
os tons de azul refletidos do céu mesclavam-se a lilases e róseos e, muitas
vezes, de fogo. Parecia então que, se ela ali mergulhasse, lá no fundo alcançaria
a imensidão do céu.
Este era também o momento mágico do
despertar de Lagoa, quando os jovens se reuniam em coro para saudar o
aparecimento da lua que não tardaria a chegar.
Rana não era como a maioria
despreocupada das companheiras que, adoravam coaxar a noite inteira até o
nascer do sol.
Sua vida jovem de apenas quatorze
anos e irmã de uma poça inteira de girinos, era a de acordar com o ocaso e só
repousar com a aurora, cuidando, provendo alimentos e executando até trabalhos
braçais masculinos. A mente, contudo, permanecia viva e repleta de sonhos
engaiolados sem liberdade de voar, como as garças brancas e os biguás. Sentia
dentro do seu inquieto coração que o mundo não era apenas aquilo e sonhava à
porta da toca dos ribeirinhos.
Sem nenhum aviso, a miséria
e a fome chegaram de mãos dadas quando o pai de Rana morreu e foi levado ao
sambaqui.
O mundo de Lagoa sempre foi cruel
com os enfraquecidos e despreparados.
A “seleção natural” não conhece misericórdia.
À
pobre família restou barganhar sua linda prenda com um batrachio viciado em
suco fermentado a quem chamavam “Sapateiro” e lha deram em matrimônio.
Não houve romance nem felicidade no pouco
tempo em durou esta aberração.
Um dia começaram os rumores.
Viventes de terras longínquas do sul
estavam em revolta contra os desmandos e os pesados tributos cobrados por
Sapotentes Imperiais, insensíveis e distantes.
Um grande exército esfarrapado moveu-se na
direção de Lagoa. Os viventes locais agitaram-se e bateram muito papo, dançaram
e cantaram anunciando um novo mundo com nova sapolítica em que o “todo poder
emanaria dos bagres”.
De fato, os esfarrapados chegaram,
expulsaram os imperiais e proclamaram que Lagoa agora era Capital de uma pátria
livre.
Sapateiro aproveitou a onda e fugiu
com eles, abandonando casa e família.
Entre os comandantes das forças
libertadoras havia alguém que tinha um sotaque diferente, vindo de uma terra de
além-mar. Falava coisas bonitas e sabia coaxar canções sapolitanas.
O amor entre a linda Rana e Giusappo
Garibaldi foi bonito e selado definitivamente quando ele lhe disse num momento
solene:
- “D’ora in piu tu sarai la mia Ranita”.
Ranita era mais que uma “femina”.
Sabia amar o amor de um guerreiro e a ele entregou-se, corajosa e sonhadora, de
corpo, vida e destino. Todo o sonho que estava aprisionado em si explodiu
naquele momento de lutas e perdas numa heroína de fogo e sangue, de proporções
muito maiores do que a mesquinhez de Lagoa jamais poderia compreender e
engolir.
Para os lagoenses Ranita não passaria
nunca de uma degenerada. Jamais a perdoaram e por mais de um século sua imagem
foi tripudiada, motivo de risos e chacotas difamantes.
Mas, os lagoenses estão perdendo
tudo. Sua história vai aos poucos para as lixeiras dos sambaquis, jamais lançam
olhares à distância, deixam levar suas mais preciosas relíquias, sem reação,
numa apatia doente e vergonhosa. A eles
interessa apenas a vantagem que possam arrancar do momento, uma sociedade perdedora
do passado e despreparada para o futuro.
A Seleção Natural tomará conta deles.
No momento, entretanto, estão arrancando Ranita do túmulo onde repousa com honras de “Heroína de dois Mundos”, tentando salvar alguma vantagem que atenda aos seus negócios de comércio, atraindo visitantes para Lagoa.
OS LAGOENSES NÃO MERECEM RANITA.
Para este simples cágado contador de causos, Ranita é a fêmea que a “Seleção Natural” não conseguiu apagar. Tendo apenas seu caráter e seus sonhos como arma de combate, saiu à frente do seu tempo e projetou sua imagem feminina para todas as outras com lições imortais de como se ama sua pátria, seus filhos, seu companheiro de vida. De como se pode ser um ente livre, de corpo e de alma, igual em natureza, altivez e força.
Ranita não me sai da mente, nem do
coração e por isso arrisco, embora não seja um sapo cantor, a dizer estes
versos:
Raninha, filha do vento,
Não cases com Sapateiro
Não é o teu sentimento
Não é amor verdadeiro.
Raninha, linda criança,
Por que não ficas comigo?
Este marujo de França
Te arrastrá ao perigo.
Ranita, morena linda,
Não abandones tua terra.
Não terás paz nesta vida,
Nem
no amor ou na guerra
Ranita, a gaivota errante
Retorna à beira do cais
Mas, tu já vais tão distante...
- Adeus!”- para nunca mais.
_____ooooooo____
segunda-feira, 10 de abril de 2017
O ARTIGO TERCEIRO (3)
UM ENCONTRO CASUAL
marcio josé rodrigues
Era
uma vez numa linda e calma manhã de sol quando Lagoa estava particularmente
deslumbrante.
Num
remanso junto ao capinzal e perto de uma moita de aguapé trazida pelo riacho,
desenrolava-se animada conversa entre eminentes cidadãos de Lagoa.
Phalacrocorax brasiliensis - Biguá Brasileiro, cormorão. |
Esperando
um momento oportuno para encaixar sua fala o Sr. Traíra sentenciou:
-
Não acham os nobres colegas, que os senhores sapos são criaturas formidáveis?
-
Eles são incríveis! Emendou a senhora Traíra, que muito se orgulhava da influência do marido. Além
de nadar, podem perfeitamente andar e saltar!.
- E
cantam! completou entusiasmada a Perereca.
-
Sem contar que discursam maravilhosamente, acrescentou o Biguá. Eu fico todo
arrepiado, continuou, quando eles
discursam. Como sabem explicar sobre a nossa vida, a nossa história. Eles falam
e a gente entende! Biguá era muito convencido porque constava nos anais que, o nome “Lagoa” teria sido originado de “Laguna de los Biguás”, batismo de antigos navegantes sapanhóis. (*)
-
Eles são realmente notáveis! São
artistas natos, inteligências superiores, têm o “dom”! – sibilou a cobra d’água,
sem desviar da perereca, os olhos cobiçosos.
Ela admirava os sapos, mas, pessoalmente,
preferia as rãs, muito mais saborosas,
sem aquele leite venenoso no pescoço.
O “bate-papo”
ali na esquina do riacho era moda, pois em Lagoa, o que os sapos faziam ou deixavam
de fazer, o que diziam e falavam, era o correto e todos copiavam.
As
opiniões estavam todas em acordo, divergindo apenas entre simpatias
particulares por grupos. Havia os que se diziam dos cururus, outros eram do
partido dos verdes, das untanhas, dos pintados e assim por diante.
-
Ah... Como eu queria ser um sapo! Suspirou o caramujo, seguido de uma
estrondosa gargalhada em coro.
-
Por que não? Quem não quer ter a vida de um sapo? O prestígio, a fama, as
mordomias, “ o poder”...
- Mas, não se esqueça também de ficar com as
responsabilidades, “seu bagre”! - atalhou bruscamente um carrasco bem grudado na
haste de uma taboa. Já pensaram nas preocupações com a educação, a saúde, a
administração pública, as finanças?
-
Eles merecem nossa gratidão e nosso respeito! Enquanto nós descansamos à noite
eles permanecem acordados e preocupados com a resolução dos problemas da
comunidade.
A Educação, a saúde, as finanças.
- A cultura!
- Lagoa é o berço da cultura!
- Lagoa de tantas e tão honrosas tradições!
Jacaré, aparentemente adormecido, escancarou de repente a bocarra num grande
bocejo e resmungou umas coisas, com visível mau-humor:
- Que gratidão, que nada! Lagoa está poluída, suja. A comida
escasseando, o mangue desaparecendo e só os sapos numa boa! Meus filhos já
estão se mudando para outros banhados! Minha mulher passa os dias em lágrimas. ( ninguém ousou rir daquele trocadilho involuntário)
Cobra d’Água explodiu num ataque viperino:
- Cale a boca, seu ignorante! Você está morrendo de inveja, porque eles têm “O PODER”!
A grosseria do jacaré criou grande mal-estar e causou o fim da agradável reunião,
não antes, porém, de se ouvirem-se brados de vivas e louvores.
- Viva o Sapresidente! Viva o sapoder!
Perereca, agora mais exposta pelo entusiasmo, nem percebia a
mal-intencionada aproximação da Cobra d'Água e agitava uma folhinha verde enquanto bradava
histérica, sobre a moita de aguapé::
- Lagoa, Terra de Ranita!
- Viva Lagoa, Terra de Ranita! bradavam em coro, menos o
jacaré.
(3) Mbiaçá era o nome da atual Laguna, como assim a chamavam os habitantes locais, os índios Carijós, na época do descobrimento do Brasil.
Navegadores espanhóis do séc. XVI, teriam denominado a "lagoa" que a banha, de Laguna de los Patos, talvez por terem confundido os biguás que eram aqui abundantes, com patos. Mas, há controvérsias. Particularmente, é minha preferida.
sábado, 8 de abril de 2017
O
ARTIGO TERCEIRO (2)
A ESPADA DE SAPALOMÃO
marcio jose rodrigues
O mundo nunca foi mais o mesmo desde que surgiram os sapos.
Parece que eles saíram da forma com um erro de projeto, na
cabeça, lá neles. Por isso eles carregam uma espécie de paranoia uma coisa
chamada “o
poder”.
Uma vez, dois reis rivais, Sapanhol e Saportuga,
importantes sapotentes, queriam ambos, muito mais poder. Estavam em vias de uma
guerra terrível para que o mundo inteiro fosse todo de um só. Mas para não
gastarem os seus tesouros, porque também adoravam seus tesouros, resolveram evitar
gastanças e empobrecimentos.
Os sapos são dotados por natureza de um aparelho
fantástico, o papo. Por isso apelaram para o recurso de “bater papo”, costume
que todos herdaram aqui em Lagoa. Todo mundo bate muito papo mesmo que todos
saibam que não vai resolver nada.
Depois de baterem muito papo, mesmo assim, nenhum dos dois querendo
ceder nadinha, na base do tudo ou nada, não chegavam a um acordo.
Por isso mandaram chamar Sua Sapiedade, o Sapa, que era o
rei dos sapólicos e a quem todos obedeciam.
O Sapa, consultando seus pergaminhos mais antigos, lembrou
de importante decisão histórica e lapidar de Sapalomão, o vivente mais sápio
que já existira e que pretendera resolver uma querela dividindo com sua espada,
uma criancinha em duas partes.
O mapa do mundo estava aberto em um varal bem à frente de
Sua Sapiedade, tendo à esquerda o rei Sapanhol e à direita o Portuga.
Sem ninguém esperar, o Sapa nem pensou duas vezes. Sacou de
surpresa a espada de um soldado distraído e... zás!
Dividiu o mapa em duas metades!
Pronto! A metade de lá era saportuga, a metade de cá,
sapanhola e não se falava mais nisso!(*)
Agora, adivinhe!
- Onde o sapa cortou o mapa?
- Pois acredite! O talho passou exatamente aqui em Lagoa!
- Baaaagreees...pasmem!
Lagoa, desde aquele dia, é o centro do mundo!
(*) Tratado de Tordesilhas - foi celebrado entre os reinos de Espanha e Portugal em 1494 com mediação do Papa Alexandre VI. Por este acordo as terras descobertas no continente americano seriam divididas pelo "Meridiano de Tordesilhas" demarcado a 370 léguas da mais ocidental das ilhas do arquipélago de Cabo Verde e cortava o Brasil desde Belém, ao norte e Laguna ao sul.
Terras a leste da linha pertenceriam a Portugal e a oeste, à Espanha.
(*) Tratado de Tordesilhas - foi celebrado entre os reinos de Espanha e Portugal em 1494 com mediação do Papa Alexandre VI. Por este acordo as terras descobertas no continente americano seriam divididas pelo "Meridiano de Tordesilhas" demarcado a 370 léguas da mais ocidental das ilhas do arquipélago de Cabo Verde e cortava o Brasil desde Belém, ao norte e Laguna ao sul.
Terras a leste da linha pertenceriam a Portugal e a oeste, à Espanha.
sexta-feira, 7 de abril de 2017
O ARTIGO
TERCEIRO
por márcio josé rodrigues
APRESENTAÇÃO
Esta fábula narra alguns acontecimentos de um lugar real,
mas aqui apresentado com o nome fictício de Lagoa Preta ou simplesmente, Lagoa.
Vai falar da paranoia do poder a qualquer preço, da
covardia e irresponsabilidade de um povo que assiste apático e indiferente à
destruição da sua cultura, seus valores e seu futuro.
O título. “O Artigo Terceiro” é filho da Teoria da Evolução
das Espécies do naturalista inglês Charles Darwin e a impiedosa “Seleção
Natural” que derrota os fortes e faz sobreviver os mais aptos.
Lagoa também está sujeita a esta lei.
CAPÍTULO PRIMEIRO
- Eu sou apenas um bagre! Na verdade, um cágado!
Explico.
Quando os sapos aqui chegaram e tomaram
o poder, enganando os outros viventes, decretaram que só eles, os “anphibios”
eram a raça superior. Em segundo lugar vinham seus parentes mais pobres, as
rãs, os carrascos, as gias e pererecas, denominados “batrachios”, o que é a
mesma coisa.
Nós, eu e você, os demais, enfim, somos
apenas ”bagres”.
Nós os cágados, somos animais muito tímidos e passamos a
vida escondidos dentro da nossa carapaça.
Você pode
pensar que a vida dentro de uma carapaça deve ser desinteressante e sem
perspectivas, mas devo dizer que tem lá suas vantagens, dependendo do ponto de
vista. Faça chuva ou sol, em qualquer lugar, você tem sempre a sua casa
própria, por exemplo. Também não temos inimigos naturais porque não é fácil
mastigar uma carapaça de cágado e muito menos, engolir um cágado com carapaça e
tudo.
Esta segurança livra-nos de histerias, estresses e outras
neuras que costumam atormentar os demais viventes. Daí, sermos conhecidos por
nossa absoluta calma em qualquer circunstância e imperturbável paciência. Isto
proporciona-nos uma vida muito longa, boa para observar o mundo,
confortavelmente debruçados na janela da frente e quase uma eternidade para
pensar e repensar os sinais dos tempos.
Parecemos tímidos, mas a timidez fez-nos prudentes.
A prudência fez-nos introspectivos, pensadores, mais
calados, bons ouvintes e muito observadores.
O repetitivo exercício de pensar tornou-nos espertos,
sábios.
Estas virtudes ou defeitos, sei lá, fazem-nos, até certo
ponto, filósofos...
A fábula é um estilo literário que existe desde a antiguidade. Sumérios já a usavam no registro de seus famosos provérbios.
Foi na Grécia, porém, no século V a.C. , que um escravo grego, Esopo, lhe deu a graça e a forma que a consagraram.
Nela usa-se a "antropomorfização" dos animais, isto é, dar a eles características humanas, de pensamento, sabedoria e fala, para descrever e criticar a sociedade sem mencionar nomes de pessoas poderosas, mas seus comportamentos.
Em tempos modernos, Jean de La Fontaine foi o expoente e usou-a para criticar o comportamento frívolo e irresponsável dos poderosos da França do século XVI ( A cigarra e a formiga, O lobo e o cordeiro, A raposa e o corvo).
Nossos índios eram impressionantes fabulistas e nos legaram histórias divertidíssimas de macacos, onças, tatus e outros animais.
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