Nas antigas florestas deste lado do mundo, uma grande amizade nascera e se perpetuava por tempos imemoráveis, entre a floresta e as nuvens.
Nuvens parecem todas iguais, mas havia uma delas que tinha uma especial afeição, nada que se comparasse com as demais, por um gigantesco cedro, que havia nascido numa colina à beira de um paradisíaco vale, há mais de mil anos.
Quando ela passava em sua ronda em torno do planeta, fazia chover sobre ele uma garoa suave e vivificadora, fresca, que o aspergia e encharcava de carinho o bastante para sobrar em abundância, a água para alimentar o majestoso rio que corria pela campina logo abaixo.
Ele agitava alegremente sua copa ao vento e desprendia um suave aroma de sua resina preciosa. Assim, sua amiga partia totalmente perfumada, de volta à rotineira viagem, levando consigo aquela lembrança de seu amigo.
Um dia, porém chegaram os homens de pele clara, com suas mulheres e crianças e seus machados de ferro. Iniciaram um lento processo de destruição e abertura de clareiras para construírem suas casas, perseguindo e matando os animais, caçando e exterminando os antigos habitantes de pele escura que viviam em paz com a mata. E mandaram notícias aos seus semelhantes, que continuaram chegando cada vez mais numerosos, em multidões furiosas, doidos varridos de ambição e morte. E eles descamparam a antiga floresta para suas estranhas plantações, poluíram o cristalino rio com venenos desconhecidos, extinguiram os peixes e aprisionaram as aves, rasgaram estradas em uma incontrolável fome de mais madeira. E assim se foram as imbuias, os pinheiros, os jacarandás, as caneleiras, as perobas e os garapuvus..
Um dia aconteceu o ninguém imaginara, nem mesmo para a maioria daqueles doidos. O rei da floresta, a mais idosa de todas as árvores, não resistiu a dias e noites a fio, à tortura dos golpes de machado.
O velho cedro também ruiu por terra.
Quando as nuvens retornaram e viram a devastação daquele lugar, ficaram perplexas. A nuvenzinha, porém, ao perceber o desaparecimento de seu velho amigo, entrou em desespero. Voou pelas as vizinhanças à sua procura, a chamar alto por seu nome sem, contudo, obter resposta ou , quem sabe, sentir um só resquício de seu perfume. A ela uniram-se as demais amigas, tantas eram, que esconderam o sol.
Por dias e noites sem parar, clamavam e seus gritos desesperados eram trovões que ribombavam pelas quebradas das montanhas, fazendo tremer tudo em volta. E acenderam suas luzes para iluminar a escuridão e suas luzes eram raios fulminantes que incendiavam , colocando os homens em pânico.
Cansadas e sem mais esperança daquela procura insana, as nuvens puseram-se a chorar de dor e saudade.
Suas lágrimas copiosas fizeram transbordar o rio, inundando as cidades, matando, fazendo desmoronar as encostas, soterrando casas, carregando pontes, deixando em tudo, um palco de terror e desolação.
Quando o vento as empurrou, enfim, para o vazio do espaço, quando o céu recuperou a cor azul, não restara muita coisa daquilo que era o lugar das pessoas. O sol voltou e eles recomeçaram suas vidas tentando reconstruir seus lares nos estreitos espaços em que se amontoam.
As nuvens estão agora em viagem ao redor do mundo.
Elas voltarão na próxima primavera, ou quem sabe no inverno ou outono à procura de suas amigas, as árvores.
E, com muito mais saudade, vão chorar de novo, e de novo, talvez muito mais e com maior desespero, enquanto os homens não aprenderem a conviver com a floresta.